quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

A motivação para a missão

A missão de Jesus nos oferece um modelo de missão não apenas quanto à integralidade, mas também quanto à motivação. Segundo Mateus 9.36, ao ver as multidões, Jesus “teve grande compaixão delas, porque andavam cansadas e desgarradas, como ovelhas que não têm pastor”. A compaixão era sua motivação. A palavra grega “splagchniszais”, que neste caso se traduz como “compaixão”, é a mesma usada em Lucas 10.33 para referir-se à atitude do bom samaritano na parábola de Jesus — o samaritano que, ao ver o homem que havia sido atacado pelos ladrões no caminho de Jerusalém para Jericó, parou para ajudá-lo. Antes dele, um sacerdote viu o homem ferido e “passou de largo”. O mesmo fez um levita. Em contraste, quando o samaritano o viu, “moveu-se de íntima compaixão” (v. 33) e cuidou dele diligentemente. A mesma palavra aparece também em Lucas 15.20, que afirma que, na parábola do filho pródigo (ou melhor, dos dois filhos perdidos), quando o pai do filho que havia esbanjado a herança o viu voltando para casa, “se moveu de íntima compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou”. 

Nos Evangelhos Sinóticos, este termo grego, além das poucas vezes em que aparece nas parábolas de Jesus, é usado para referir-se a uma das características de Jesus como Messias. É a compaixão do ungido de Deus ao ver a tristeza da mulher cujo filho morreu (Lc 7.13), ao ver os enfermos (Mt 14.14), os cegos (Mt 20.34), os leprosos (Mc 1.41), as multidões famintas e cansadas (Mt 15.32).

O que provocou a compaixão de Jesus, segundo o texto de Mateus 9, foi ver as multidões “cansadas e desgarradas, como ovelhas que não têm pastor”. Esta última frase é um eco de Números 27.17, no momento em que Moisés pede a Deus que proveja para Israel um líder que ocupe seu lugar de modo que o povo de Deus não fique “como rebanho sem pastor”. 

Cabe, no entanto, perguntar se as multidões no tempo de Jesus precisavam de líderes. Elas tinham líderes, mas eles estavam concentrados em Jerusalém, usufruindo dos privilégios derivados da posição social, incluindo as luxuosas mansões. Enquanto isso, os campesinos da Galileia e da Judeia, por causa do tributo imperial e dos impostos do templo, perdiam as terras herdadas e se transformavam em locatários de seus opressores. A situação descrita em Ezequiel 34 se repetia com líderes que, sem constrangimento, agiam com avareza, enquanto o povo morria de fome.

Jesus não via as multidões como meras almas que precisavam apenas salvar-se espiritualmente. Ele as via como pessoas oprimidas, abandonadas pelos seus líderes, vítimas da injustiça. E, ao vê-las, tinha compaixão delas.

Sem compaixão não há missão; menos ainda a missão integral, que inclui a restauração das relações da pessoa com Deus, com o próximo e com a criação. Pode haver proselitismo e persuasão para mudar de religião ou unir-se a um culto, mas não a missão que tem como modelo a missão de Jesus Cristo.

Ao redor do mundo hoje e na Palestina do primeiro século, as multidões precisam de líderes compassivos dispostos a serem líderes-servos. Em todos os lugares é evidente a ausência de líderes com uma integridade moral que os capacite a colocar os interesses do povo sobre os próprios interesses. As classes dominantes, constituídas por militantes ou políticos, executivos de empresas ou comerciantes oportunistas, são geralmente insensíveis às necessidades da maioria. Nessas circunstâncias é urgente que nós que confessamos a Jesus Cristo como nosso Senhor vejamos as multidões “cansadas e desgarradas, como ovelhas que não têm pastor”. Á medida que as olharmos com os olhos de Jesus, entenderemos sua situação e seremos movidos pela compaixão, de maneira a suprirmos a demanda de líderes-servos como Jesus.





Fonte:  René Padilha em Ultimato
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