quarta-feira, 20 de junho de 2012

O 'príncipe' do Hamas convertido ao cristianismo volta a Jerusalém

Elegantemente vestido, com cabelos cuidadosamente penteados, inglês perfeito e trejeitos de orador experiente, Mosab Hassan Yousef, de 34 anos, autor da autobiografia "Filho do Hamas", de 2010, na qual desvendou segredos do movimento islâmico, não esconde a emoção de voltar ao Oriente Médio.

- Estou em casa - diz o palestino, na primeira visita a Jerusalém depois do autoexílio nos Estados Unidos, em 2007.

Primogênito do xeque Hassan Yousef, um dos fundadores do grupo islâmico que controla a Faixa de Gaza com mão de ferro, ele fugiu dos territórios palestinos depois de ter abalado os alicerces do Hamas ao se converter ao cristianismo e admitir ser informante dos serviços de segurança de Israel. Cinco anos depois, ele volta à região onde cresceu e na qual foi deserdado pelo pai e renegado pela família.

Mosab garante que decidiu viajar a Israel por nostalgia e sem apoio de governos ou empresas, mas ele tem a agenda lotada de encontros com autoridades e intelectuais. Foi até mesmo convidado a discursar na Knesset, o Parlamento israelense. A todos, não hesita em desfiar as ideias que o tornaram polêmico, entre elas a de que o islamismo é uma religião violenta e que regimes islâmicos se aproveitam da ignorância de seus cidadãos para controlá-los.

- O Islã não prega a paz, é uma religião de guerra - decreta Mosab. - Sei que o que eu digo é controverso. Mas a verdade é que o Islã se protege há 1.400 anos por trás do isolamento e do controle absoluto das vidas de seus fiéis. A maioria dos muçulmanos não entende a real natureza de sua religião e do profeta que tanto amam.

Nascido em Ramallah, na Cisjordânia, ele diz querer ser um modelo para os jovens palestinos, mesmo sabendo que suas ideias não só são vistas como traição como podem matá-lo. O escritor já recebeu várias ameaças de morte através de seu site. Ele conta que passou a colaborar com o Shin Bet e o Mossad, os serviços de segurança de Israel, depois de entender a "real natureza" da organização da qual seu pai foi um dos fundadores. Nunca se arrependeu, afirma, seguro de que salvou muitas vidas:

- Quero passar uma mensagem às novas gerações de palestinos: não tenham medo. Se acreditarem em algo, sigam o coração. O problema é que é difícil lutar contra sua cultura, sua identidade. Esse é o drama humano que inibe muita gente de defender o que é certo.

Pai está preso em Israel e mãe não o reconhece

O governo israelense não se entusiasmou com a vinda de Mosab ao país. As autoridades temiam que ele se tornasse um ímã para ataques de extremistas islâmicos. Mas o palestino não parece se abalar, dizendo-se "preparado para pagar o preço de dizer a verdade". Ele afirma que sua jornada lhe custou o amor de sua família. Sua mãe o renega, seu pai o deserdou.

- Entendo por que sou uma vergonha para eles e os perdoo - contemporiza Mosab.

Ao que tudo indica, essa situação não vai mudar com a atual viagem. Seu pai, o xeque Hassan Yousef - novamente detido em Israel depois de ter sido libertado, há um ano, favorecido na época pela superlotação das prisões - emitiu um comunicado repetindo não reconhecer Mosab como filho. Esse é o tom, também, de sua mãe.

- Não quero ser chamada de mãe dele porque ele não é meu filho - vociferou Shubha Yousef à agência de notícias Reuters. - Ele deu sua lealdade a outra religião que não o Islã. Ele não salvou ninguém. São apenas mitos em sua cabeça.

No livro, Mosab expõe o relacionamento com seu contato no Shin Bet entre os anos 90 e durante a segunda intifada, de 2000 a 2005, quando ganhou o codinome de Príncipe Verde (numa referência à cor usada pelo Hamas). Na época, já secretamente convertido ao cristianismo, ele supriu informações que ajudaram a prevenir dezenas de atentados terroristas. Gonen Bar-Yitzhak, seu contato no Shin Bet, hoje é seu amigo pessoal.

- Ele é meu irmão de outra mãe - declara Bar-Yitzhak. - Nunca conheci ninguém como ele. Muitos palestinos condenam o terrorismo e a insistência dos árabes em não reconhecer Israel. Mas todos têm medo de ferir suas famílias caso atuem contra isso.

A visita a Israel também serve de plataforma para o anúncio de dois projetos cinematográficos dos quais Mosab participa como produtor, roteirista e principal inspiração. O primeiro é a transformação de seu best-seller, já traduzido para 25 línguas, inclusive no Brasil, em filme de Hollywood. O cineasta Sam Feuer, israelense radicado em Los Angeles, informa que as filmagens já começaram. O plano é lançá-lo no ano que vem.

- Queremos filmar a maior parte em Israel, para ficarmos o mais próximos possível da realidade - diz Feuer.

Mas é o segundo projeto - também com participação do cineasta - que promete ser mais explosivo: a produção de um outro filme - ou seriado de TV sobre a vida de Maomé revelando lados humanos do profeta do Islã, incluindo os menos positivos. Mosab Hassan Yousef sabe que se trata de um tabu.

- Há inúmeros filmes sobre as vidas de líderes religiosos, exceto um, intocável! Ninguém pode nem mesmo fazer uma caricatura sobre Maomé por medo do que pode acontecer - alfineta Mosab. - Mas aproveito que estou perto do Monte do Templo (na Cidade Velha de Jerusalém) para anunciar que é chegada a hora de expor a vida de Maomé. Os muçulmanos têm uma noção idealizada dele. A maioria tem mais moralidade do que ele jamais teve.

As críticas ao islamismo levam o palestino a fazer previsões nada otimistas para o futuro dos países da Primavera Árabe, as revoltas populares que abalam diversos países no Oriente Médio. A começar pelo Egito. Segundo ele, se for confirmada a vitória de Mohamed Mursi, candidato da Irmandade Muçulmana à Presidência, todo o esforço dos jovens da Praça Tahrir, que lutaram pela queda do ditador Hosni Mubarak, terá sido em vão.

- Não há diferença entre o Hamas e a Irmandade Muçulmana. No momento em que Mursi vencer, o Hamas terá tomado o controle do país. É uma maldição - critica Mosab.



Fonte: Agência O Globo
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